Febre em crianças: saiba quando medicar, quando observar e quando se preocupar.

Se você tem filhos ou convive com crianças pequenas, provavelmente já passou por isso: a criança acorda quente, olhos brilhantes, talvez mais quieta ou chorosa que o habitual. Você encosta na testa com a mão e sente aquele calor típico que dispara um alarme interno. O coração acelera, porque febre em crianças mexe com qualquer adulto – mesmo os mais experientes.

Agora respire fundo. É natural se preocupar ao notar uma criança com febre; ninguém quer vê-la desconfortável ou ignorar algo mais sério. Mas aqui está uma verdade importante: nem toda febre exige uma ida apressada ao hospital ou o uso imediato de remédios. Muitas vezes, ela nem deveria ser vista como uma “inimiga”.

Vamos entender melhor o que significa quando uma criança apresenta febre. Este é um tema cercado de dúvidas e mitos: ainda há quem pense que febre alta pode “derreter” o cérebro (spoiler: não pode!) ou quem fique obcecado em “zerar” a temperatura a qualquer custo. Antes de falar sobre sinais de alerta ou o momento certo para recorrer aos antitérmicos, é essencial compreender o que acontece no corpo da criança quando a febre aparece.

Com mais conhecimento, você se sentirá mais confiante para decidir se deve apenas observar ou agir. E essa decisão será tomada com calma e baseada em uma avaliação consciente do comportamento da criança e nas informações corretas sobre sua saúde.


O que é a febre e por que ela surge?

Muita gente associa febre automaticamente a doença – o que não está totalmente errado –, mas isso é só parte da história. Para começar, vamos entender exatamente o que é a febre.

A temperatura do nosso corpo costuma ficar estável entre 36 e 37 °C na maior parte do tempo. Esse equilíbrio térmico é controlado por uma área do cérebro chamada hipotálamo – como se fosse o “termostato natural” do corpo humano. Quando percebemos alguma ameaça externa (como vírus ou bactérias) ou interna (inflamações), o hipotálamo pode ajustar esse termostato para cima, elevando nossa temperatura corporal.

E por quê? Essa resposta faz parte de um plano estratégico da nossa imunidade! Muitos microrganismos causadores de doenças têm dificuldade em se multiplicar ou sobreviver em temperaturas mais altas. Assim, a febre funciona como uma espécie de arma biológica natural – um esforço do corpo para criar um ambiente menos favorável aos invasores enquanto estimula as células de defesa. A febre, por si só, não é uma doença, mas sim um sinal de que algo está acontecendo no organismo. Isso, no entanto, não significa que esse “algo” seja grave ou perigoso.


Febre: amiga ou inimiga?

Agora que sabemos que a febre faz parte do sistema defensivo do corpo, precisamos falar sobre como interpretá-la nas crianças. Pense na febre como uma mensageira; ela carrega informações importantes sobre o estado geral da saúde.

Na maioria das vezes, a febre aparece como uma reação natural do corpo a infecções comuns e passageiras, como os típicos resfriados virais da infância. Nesse contexto, ela age protegendo a criança sem causar grandes problemas. Ainda assim, há momentos em que a febre pode indicar algo mais preocupante. Quando sua presença está associada a outros sintomas, é hora de ficar alerta. Exemplos incluem letargia excessiva, dificuldade respiratória ou manchas pelo corpo.

Resumo rápido:

  • Febre transitória + criança ativa/brincando: geralmente segura.
  • Febre contínua + outros sinais preocupantes: merece atenção especial.

É importante lembrar que a gravidade da febre não se baseia apenas nos números do termômetro. O comportamento da criança é um indicador muito mais confiável.


O que é considerado febre em crianças?

Uma dúvida comum é: qual temperatura realmente indica febre? Aqui estão os parâmetros gerais:

  • Temperatura axilar acima de 37,8 °C é considerada febre.
  • Valores entre 37 °C e 37,8 °C são classificados como estado subfebril.
  • Acima de 39 °C, chamamos de febre alta.

Essas medições variam conforme o local onde você mede:

  • Axila: método mais tradicional, com valores geralmente menores.
  • Reto ou boca/auricular: cerca de 0,5 °C acima dos valores axilares.

Para bebês menores de 3 meses, qualquer alteração térmica deve ser comunicada ao médico, pois infecções podem evoluir rapidamente nessa faixa etária. Além disso, escolha um termômetro confiável. Os digitais são os mais indicados pela precisão e praticidade, enquanto os infravermelhos podem ser úteis, mas exigem cuidado para evitar leituras inconsistentes.


Observar ou medicar?

Quando a febre aparece, surge a dúvida: medicar imediatamente ou apenas observar? Essa decisão pode assustar, mas o segredo está em avaliar mais do que a febre em si: o comportamento da criança é uma pista muito mais confiável do que os números absolutos da temperatura.

Se a criança está ativa entre picos febris, brincando ou reagindo bem, isso geralmente é um bom sinal. O corpo pode estar lutando contra um vírus ou bactéria comuns. Nesse caso, você pode monitorar e focar no conforto dela.

Por outro lado, se houver sintomas como letargia profunda, dificuldade para respirar ou irritabilidade persistente, é necessário buscar avaliação médica, independentemente da temperatura registrada.

Os antitérmicos, como paracetamol e ibuprofeno, são seguros quando usados nas doses corretas, considerando peso e idade. Eles não “curam” a febre, mas ajudam a aliviar o desconforto. Algumas dicas importantes:

  • Respeite os intervalos indicados na bula (geralmente entre 6 a 8 horas).
  • Evite misturar diferentes tipos de antitérmicos, a menos que o médico assim oriente.
  • Se a febre não ceder após várias doses ou voltar rapidamente, procure orientação médica.

Medidas naturais: funcionam?

Entre um antitérmico e outro – ou quando você decide não medicar ainda –, medidas simples podem ajudar:

  • Banhos mornos: ajudam a regular a temperatura e relaxam o corpo.
  • Hidratação: beber bastante líquido é essencial para combater infecções.
  • Roupas leves: evitam a sensação abafada da febre alta.

Evite práticas antigas, como álcool na pele ou gelo na testa, que podem causar danos à pele sensível ou até quedas perigosas na temperatura corporal.


Quando a febre é um alerta?

Febres que vão e voltam por dias seguidos podem ser preocupantes. Infecções virais comuns geralmente duram entre cinco e sete dias, mas febres persistentes ou recorrentes (mais de 7 dias) exigem atenção médica. Casos que merecem avaliação incluem:

  • Infecções bacterianas, como infecção urinária.
  • Febres acompanhadas de erupções cutâneas persistentes.
  • Dificuldades alimentares graves associadas à febre.

Se tiver dúvidas, não deixe de buscar avaliação médica. Lembre-se: a febre não é vilã, mas um sinal do sistema imunológico trabalhando. Observe seus filhos com atenção e mantenha a calma. Isso faz toda a diferença para oferecer o apoio necessário.

Dra. Sara Koefender Castro
Médica de Família e Comunidade
CRM/RS 39979 RQE 32341

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